António Carlos Rodrigues (Grupo Casais): "É incontornável que vamos caminhar para uma redução dos resíduos e que vamos ter uma maior valorização dos mesmos"
Com o foco na sustentabilidade, a atividade do Grupo Casais privilegia os princípios da economia circular, promovendo a utilização de sistemas e técnicas de construção que permitem gerar maior valor acrescentado.
E o futuro da construção vai passar precisamente, pela redução e valorização dos resíduos. Quem o diz é o CEO do Grupo Casais, Eng. António Carlos Rodrigues, em entrevista à equipa do CVR: "Quer a consciência ambiental, quer a legislação vai conduzir cada vez mais este processo".
Veja a entrevista completa.
A estratégia do Grupo Casais é muito assente no conceito de sustentabilidade: ambiental, social e económica. De que forma é que procuram garantir a sustentabilidade nestas vertentes e como é que procuram aplicar os princípios da economia circular?
Consideramos que a energia do século XXI se chama conhecimento e tecnologia. E é esta energia que está a permitir ao Grupo Casais impulsionar, por exemplo, a passagem do trabalho em obra para unidades fabris, reduzir os prazos de execução, os desperdícios e a pegada de carbono ou ainda criar melhores empregos e investir em soluções e produtos mais sustentáveis. Na nossa atividade, aplicamos os princípios da economia circular utilizando sistemas e técnicas de construção que permitem gerar maior valor acrescentado.
Sabemos que estamos num mundo em constante mudança e que existe a necessidade de adotar a abordagem “design for change”, ou seja, “projetado para ser alterado”, que é imperativa para o nosso Grupo. A resposta a isto está na industrialização e na estandardização, o que temos feito em parceria com a CREE, que utiliza soluções de madeira híbrida. A eficiência deste método construtivo já foi comprovada com a industrialização de um piloto à escala real, onde replicamos um quarto de Hotel e um Apartamento T2 e, recentemente, através da produção do sistema CREE para o Hotel B&B em Guimarães, o primeiro edifício híbrido a ser construído na Península Ibérica.
Além de contribuir para a redução da pegada de carbono e para a circularidade dos materiais, a industrialização impulsiona a passagem do trabalho em obra para unidades fabris. Para promover a construção sustentável e edifícios eficientes e saudáveis, estamos ainda a apostar no e-commerce, através da nova marca FioBlu e da respetiva loja online. Assumindo-se como uma plataforma digital que disponibiliza um amplo portefólio de produtos e soluções sustentáveis para edifícios saudáveis, esta marca está disponível em Portugal e, em breve, em Espanha.
O complexo de construção híbrida em Guimarães é um projeto pioneiro na Península Ibérica. Que impactos positivos é que esta alternativa traz e de que forma pode ser um exemplo para o futuro da construção em Portugal?
O B&B Guimarães é um hotel composto por 95 quartos e um bloco de apartamentos (44 estúdios) e consiste num projeto que contempla várias soluções off-site que integram preocupações de sustentabilidade ambiental, ao nível da saúde ocupacional dos futuros utilizadores e também da eficiência energética.
Em detalhe, este edifício incluiu o pré-fabrico de componentes individuais, como painéis de laje, painéis de fachada, pilares, estruturas, paredes interiores e racks de especialidades. Desta forma, esta construção permite uma redução de 60% das emissões de carbono e incorpora interiores numa filosofia de economia circular, onde 50% dos materiais podem ser reutilizados no final do ciclo de vida. Este edifício permite ainda uma resolução de resíduos em 70% e da poluição sonora em mais de 50%, além de reduzir os prazos de execução em 50% em comparação com o tradicional.
Posso destacar que a assemblagem do 1º e 2º blocos do edifício foi finalizada em apenas oito dias úteis cada (cada bloco tem quatro pisos), confirmando-se um marco no processo da industrialização da construção em Portugal. Além do que já referi, o método adotado também contribui para o aumento da qualificação profissional e a redução de riscos e acidentes, numa época de escassez de recursos qualificados.
Além de reduzir a pegada de carbono, este é também um edifício inovador pelo seu processo de construção: foi desenvolvido com uma base BIM [Building Information Modeling], numa lógica de indústria 4.0, com suporte em princípios de “design for manufacturing and assembly”.
O Grupo Casais tem adquirido o conhecimento necessário para potencializar a colaboração com Arquitetos e Engenheiros no desenvolvimento de projetos, de modo a adaptar as soluções off-site a qualquer tipo de desenho “in-house”. Naquilo que fazemos, nomeadamente em projetos inovadores e de grande impacto como é este primeiro edifício híbrido da Península Ibérica, acreditamos poder influenciar positivamente o setor da construção e os setores que com ele se relacionam, concretamente no que toca às questões ambientais e ao legado de construção que podemos deixar às próximas gerações.
Com mais de 60 anos, e presente em vários pontos do mundo, o que é que o Grupo Casais ainda ambiciona?
Os nossos mais de 60 anos de experiência são o maior e melhor impulso para continuar a perspetivar um bom futuro. Estamos conscientes de que essa construção é seguramente mais complexa e exigente do que seria há uns anos atrás, mas é exatamente por isso também mais motivadora. Esta é a marca que o Grupo CASAIS, presente em 17 mercados, quer deixar na sua história, contribuindo acima de tudo para a credibilização do setor da construção e das carreiras dos seus profissionais.
Temos a consciência do papel fundamental que este setor desempenha na economia e do seu impacto global, e é também por isso que temos como missão desenvolver pessoas e comunidades mais fortes. Mobilizamos pessoas que são portadoras de competências, capazes de capacitar e de serem capacitadas. Entre regiões e países, transferimos produtos e serviços criando riqueza e valor acrescentado. Geramos uma rede de conhecimento que circula livre, viaja à velocidade da luz e passa fronteira sem necessidade de visto. O nosso investimento regional produz riqueza, que se espalha sob a forma de rendimento (os salários) e conhecimento (as competências) para a comunidade local e são estes que, eventualmente, proporcionam acesso a uma casa, água potável, energia, conetividade, educação e saúde.
Continuamos a trabalhar com o objetivo de mostrar que o setor da construção é um setor de oportunidades, dinâmico e em permanente evolução. E que essa evolução significa uma constante procura de conhecimento para a construção de um mundo cada vez melhor.
Qual a vossa visão para o futuro da indústria da construção? O panorama é otimista no que diz respeito à redução/valorização dos resíduos deste sector? Que papel ou contributo poderá ter a legislação nesta questão?
É incontornável que vamos caminhar para uma redução dos resíduos e que vamos ter uma maior valorização dos mesmos. Quer a consciência ambiental, quer a legislação vai conduzir cada vez mais este processo.
A construção atualmente é demasiado extrativa e o ciclo de obsolescência é cada vez mais curto devido à rapidez da mudança de hábitos e necessidades da sociedade. Por isso apenas uma construção baseada em princípios de economia circular terá espaço para existir no presente e futuro. Quem não se adaptar a este paradigma não terá lugar no mercado.
A relação entre o CVR e o Grupo Casais é já longa e profícua. Como é que avaliam esta parceria e como é que, enquanto membro do Conselho de Administração, olham para o papel do Centro perante o mercado e a sociedade?
O CVR é um excelente exemplo da ligação entre a academia e o mercado. Uma academia moderna tem de capitalizar e desenvolver conhecimento e para isso precisa de participar no mercado. Este tipo de centros de competência e excelência são um bom instrumento para tal.
O conselho de administração que é composto por representantes de várias instituições e empresas também é uma boa forma de estreitar relações com operadores e instituições que interagem diretamente com a sociedade.
Para a Casais que sempre teve investimentos e negócios ligados ao meio ambiente, desde logo porque criamos em parceria quer a primeira unidade de RCDs [resíduos de Construção e Demolição], quer a primeira unidade industrial de processamento de CDRs [combustíveis derivados dos resíduos], esta relação e convivência no seio do CVR tem sido bastante positiva pela troca de experiência e colaboração.
Hoje o nosso próprio negócio core (construção) está a adotar processos e sistemas que nos colocam na linha da frente neste processo de transição onde a valorização dos produtos utilizados na construção ganha um protagonismo muito diferente daquele que tinha no passado.
De que forma é que esta parceria contribui para a “construção de um amanhã melhor”?
Se fizemos bem o nosso trabalho e cumprimos a nossa missão, as soluções construtivas que estamos a desenvolver e implementar permitem-nos pensar que aquilo que vamos construir neste século vai permitir criar um stock de componentes e soluções reaproveitáveis que podem ser reutilizadas evitar de todo seja necessário extrair qualquer material da natureza no próximo século. Por isso neste novo mundo é crucial esta colaboração entre o CVR e a indústria.