Será a Estratégia Farm-to-Fork a solução para o desperdício alimentar?
6 Julho, 2022
6 Julho, 2022

Será a Estratégia Farm-to-Fork a solução para o desperdício alimentar?

A Estratégia Farm-to-Fork, elemento central do Pacto Ecológico Europeu, visa enfrentar os desafios e acelerar a transição para sistemas alimentares sustentáveis, garantindo que os fundamentos económicos, sociais e ambientais da segurança alimentar e nutricional não sejam comprometidos nas gerações atuais e futuras.

Enfatiza-se a possibilidade de uma transição justa para todos os atores dos sistemas alimentares, na qual as desigualdades sociais são também reduzidas e a pobreza alimentar é abordada de forma holística. Esta estratégia baseia-se em soluções inovadoras que podem ser ampliadas, como práticas agroecológicas e orgânicas, fontes alternativas de proteína, alimentos sustentáveis e aconselhamento personalizado em matéria de alimentação saudável e sustentável. Na intensificação da luta contra o desperdício de alimentos, é objetivo principal diminuir para metade o desperdício per capita ao nível do retalho e consumo até 2030. Em relação aos conceitos adjacentes à temática do desperdício alimentar, é importante definir o conceito de ‘perda de alimentos’ e ‘desperdício alimentar’. Segundo a FAO, perda de alimentar considera-se a diminuição da quantidade e da qualidade dos produtos agrícolas, silvícolas e da pesca destinados ao consumo humano e que, em última análise, não são consumidos pelas pessoas. Ocorrem ao longo da cadeia de abastecimento, da produção à colheita e ao manuseamento pós-colheita, do armazenamento à transformação e durante o transporte. Por outro lado, desperdício alimentar corresponde à diminuição em todas as etapas do sistema alimentar, desde a produção até ao consumo, da massa e/ou qualidade, de comida originalmente destinados ao consumo humano, independentemente da causa. Não existe uma definição absoluta, certa ou errada, de desperdício alimentar, pelo que se convencionou definir este conceito como sendo, genericamente, qualquer alimento removido da cadeia de abastecimento alimentar humana, do campo até ao garfo.


Hoje em dia, a comida é transportada em longas distâncias e entre continentes, o que significa que os consumidores finais estão progressivamente mais desligados da fonte dos seus alimentos e que a cadeia de abastecimento se torna cada vez mais longa e fragmentada. O desperdício alimentar é, em muitos aspetos, um problema sistémico e não a responsabilidade de uma única entidade. Para o resolver, torna-se necessário que as diferentes partes interessadas se coordenem e colaborem de forma harmoniosa. À medida que a comida percorre todo o caminho do produtor ao consumidor, passa por diversas fases. Existem muitas causas que explicam por que razão a comida é perdida ou desperdiçada nas diferentes fases. A falta de sensibilização para o problema e o desconhecimento das soluções disponíveis para a sua resolução, associada à infraestrutura inadequada e ineficiente da cadeia de abastecimento, é apontada como principais causas do desperdício. A fraca colaboração ao longo da cadeia de valor e a insuficiente regulamentação, constituem também causas prováveis.


Os grandes números do desperdício alimentar, à escala global, anualmente, reportam que um terço de toda a comida produzida é desperdiçada, correspondendo a 1.3 mil milhões de toneladas de alimentos e perto de mil milhões de euros de custos associados. Com uma pegada de carbono de cerca de 3.3 milhões de toneladas de C equivalente, o desperdício de alimentos gera cerca de 8% a 10% das emissões globais de gases de efeito estufa. Se o desperdício de alimentos fosse um país, seria o terceiro maior país emissor do mundo, emitindo mais gases de efeito estufa do que todos os países do mundo, exceto a China e os EUA. 


Neste contexto, a Estratégia Farm-to-Fork, representa uma oportunidade para a Europa melhorar o estilo de vida, a saúde e o meio ambiente, criando um ecossistema alimentar favorável que facilite a escolha de dietas saudáveis e sustentáveis, beneficiando a saúde e a qualidade de vida dos consumidores, reduzindo os custos relacionados com a saúde para a sociedade. Mesmo quando as sociedades se tornam mais urbanizadas, é fundamental que se sintam conectadas à sua comida, privilegiando alimentos frescos, menos processados e de origem sustentável. A solicitação de cadeias de suprimentos mais curtas intensificou-se durante a pandemia. Paralelamente, os consumidores devem ter o poder de escolher alimentos sustentáveis e todos os atores da cadeia alimentar devem ver isso como sua responsabilidade e oportunidade. A transição para sistemas alimentares sustentáveis requer uma abordagem coletiva que envolva autoridades públicas em todos os níveis de governação, atores do setor privado em toda a cadeia de valor alimentar, organizações não governamentais, parceiros, academia e cidadãos.

 

Joana Carvalho

Coordenadora do IDT - Departamento de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico